sexta-feira, 14 de maio de 2010

Retificação judicial x extrajudicial

Casos complexos de retificação da descrição tabular do imóvel devem ser destinados à via judicial?
Não existe diferença de “poderes” entre juiz e registrador diante de um procedimento de retificação de registro (judicial e extrajudicial), pois ambos devem atuar nos termos da lei, que é igual para todo mundo.
A decisão por um ou outro tipo de procedimento (permitida pelo artigo 212 da LRP) é exclusiva do interessado, motivo pelo qual se trata de uma competência concorrente entre registrador e magistrado, cabendo àquele que foi eleito pelo particular dar solução adequada ao caso.
Não há hipótese legal de retificação da descrição tabular do imóvel que possa ser feita pelo juiz e não possa ser feita pelo registrador. Tratando-se, por exemplo, de real acréscimo de área de longeva posse, nem o juiz poderá determinar a retificação, devendo extinguir o processo por falta de interesse de agir (inadequação da via eleita), pois ao interessado cabe apenas a ação de usucapião.
Além disso, tem o registrador melhores condições do que o magistrado de chegar a uma solução mais correta, pois o assunto é eminentemente técnico e o registrador dispõe de um excelente arquivo para comprovar a realidade jurídica dos fatos.
Esmiuçando as hipóteses práticas passíveis de tal corrigenda, o legislador ordinário veio deslocar o âmbito da discussão, entregando grande parte de seu processamento ao oficial registrador, longe da contaminação processual burocrática e formal e longe dos conservadores órgãos de vigilância, reverenciando a relevante questão social que forma grande parte do substrato de tal modalidade procedimental, e reconhecendo que esta questão é meramente técnica.[1]
O registrador somente pode se declarar incompetente em um procedimento retificatório se houver conflito não solucionável pela via da transação, pois, nos casos em que há lide, a competência do Judiciário é absoluta.
A recusa em protocolar um requerimento de retificação de registro imobiliário, induzindo o interessado a buscar a via judicial, configura falta funcional grave, podendo o registrador ser punido até com a perda da delegação.

Lei nº 8.935/94 - Serviços Notarias e de Registro:
Art. 30 - São deveres dos notários e dos oficiais de registro:
II - atender as partes com eficiência, urbanidade e presteza;
Art. 31 - São infrações disciplinares que sujeitam os notários e os oficiais de registro às penalidades previstas nesta Lei:
V - o descumprimento de quaisquer dos deveres descritos no artigo 30.
Art. 32 - Os notários e os oficiais de registro estão sujeitos, pelas infrações que praticarem, assegurado amplo direito de defesa, às seguintes penas:
I - repreensão;
II - multa;
III - suspensão por 90 (noventa) dias, prorrogável por mais 30 (trinta);
IV - perda da delegação.


Além da falta disciplinar, essa conduta omissiva pode configurar, em tese, o delito de prevaricação.

Código Penal - Decreto-Lei nº 2.848/40:
Prevaricação
Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.

Devido à importância da importante missão que o Estado lhe delegou, o registrador imobiliário não pode se furtar de cumprir seus deveres. A sociedade depende de seu profissionalismo e dedicação. A partir do momento que aceitou a delegação estatal, a devoção ao serviço deixou de ser uma opção, pois se trata de dever funcional, e dever é para ser cumprido.



[1]    Venicio Antonio de Paula SALLES, Direito registral imobiliário, p. 29.

10 comentários:

  1. Boa tarde Dr. Eduardo

    Gostaria de saber se o senhor poderia me orientar com uma dúvida que possuo: consta na matricula de imóvel que o mesmo está em comunhão com terceiros. Contudo ao pedir certidões dos títulos de propriedade anteriores, verifica-se que não consta o nome de que sejam estes eventuais co-proprietários, e, por vezes, ao se verificar quando se iniciou tal condomínio, esta informação se quer aparece nas inscrições primitivas...
    Já perguntei ao registrador se ele poderia retificar tal matricula a pedido dos reais condôminos proprietários do imóvel (verificáveis pelos seus instrumentos de aquisição), contudo o delegatário me informou que tal retificação somente poderia se dar pela forma judicial.
    Desta forma estou sem saber como proceder, pois nem mesmo sei contra quem deverei ingressar com esta ação...
    Você poderia me esclarecer esta dúvida? Desde já agradeço...
    Att.

    Anderson Andrade de Oliveira

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    1. Olá, Anderson.
      Seu caso não trata da retificação da descrição do imóvel (especialidade objetiva) nem da correção de nome das pessoas (especialidade subjetiva), mas sim na determinação de quem seja o titular do imóvel (especialidade do fato jurídico).
      Apenas pelo "jeitão" de seu questionamento, tudo indica que a situação é realmente bastante complexa, a ponto de não ser possível a retificação tanto pela via judicial como extrajudicial.
      Veja que não há como comprovar que os interessados são os proprietários do imóvel, Cá entre nós, nem eles mesmos têm condições de dizer que são titulares do direito real de propriedade; o máximo que eles sabem é quem têm a posse mansa e pacífica.
      Diante disso, a melhor saída (que resolve a questão com toda a segurança) é uma ação de usucapião a ser proposta por todos aqueles que se dizem proprietários.
      Um abraço.
      EA

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    2. Bom dia Dr. Eduardo

      Minha idéia era outra, mas através de sua explicação, se torna claro que realmente é impossível, tanto pela via administrativa como pela judicial, a solução do caso... somente a título de informação, pensei em entrar com uma ação ordinária, informando que embora os imóveis constem no RI como frações ideais, na realidade, as mesmas já se encontram individualizadas pelo exercício da posse e que as mesmas estão dispostas geográficamente em áreas contínuas, não exercendo pessoas estranhas, posse sobre os aludidos bens... então realizaria vários pedidos: a) que fosse declarada a inexistência de condôminio em relação a terceiros que não figuram como proprietários no R-00 das Matriculas X, Y e Z; b) a unificação das aludidas frações em um só imóvel e matricula, cancelando-se as matriculas anteriores.
      Digo isso, pois já vi uma ação neste estilo na comarca de minha cidade, contudo, entendo que seria uma ação temerária...
      De toda forma agradeço sua atenção e fico imensamente feliz e satisfeito com a rapidez e eficiência com que o senhor se pré-dispõe a ajudar os que necessitam de informações mais esclarecedoras.
      Felicidade e prosperidade sempre, é o que lhe desejo.
      Abraço.

      Anderson Andrade de Oliveira

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    3. Olá, Anderson.
      Para que o direito real de propriedade seja atribuído de acordo com a posse mansa e pacífica de pessoas que não tem total respaldo no registro imobiliário, a única solução prevista em lei é a aquisição por usucapião.
      Boa sorte nessa empreitada.
      Um abraço.
      EA

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  2. Eduardo Augusto boa noite.
    Como técnico(arquiteto), estou fazendo uma Retificação de um terreno em SP, junto ao cartório de Registro de Imóveis.
    Existem sete confrontantes, mas apenas um deles não possui nenhum documento oficial registrado(Escritura/Transcrição/Matricula) que comprove o direito de propriedade, e por causa disso o perito contratado pelo cartório diz através de Intimação que a Retificação poderá ser negada pelo Oficial do R.I., conforme expressa vedação nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, in verbis:
    (ELE ESCREVEU ASSIM, O PERITO QUE É ARQUITETO E ADVOGADO)
    "CAP.XX
    124.6. Uma vez atendidos os (...)
    NOTA - A retificação será negada pelo Oficial de Registro e Imóveis sempre que não for possível verificar que o registro corresponde ao imóvel descrito na planta e no memorial descritivo, identificar todos os confinantes tabulares do registro a ser retificado, ou implicar transposição, para este registro, de imóvel ou parcela de imóvel de dominio publico, ainda que neste ultimo cason não seja impugnada."

    Inclusive a escrevente autorizada me disse:
    Se você não apresentar nenhum documento oficial deste confrontante, não iremos adiante com a análise do processo de Retificação !

    Gostaria de sua opinião e orientação para o caso.
    Muito obrigado!!
    Marcelo

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    1. Meu caso é idêntico. Uma senhora mora em um imóvel confrontante e sequer tem rg ou cpf. Deve ser invasora de favor do proprietário antigo da área. Nem foi aberto matrícula. O que me recomendaram: Fazer a planta de levantamento topográfico como antes, colocando neste confrontante: área remanesc. do loteamento tal (a área que originou os lotes da quadra)e como ocupante o nome da pessoa. Faz o memorial, art, laudo e só. Entrega nas mãos do propr. e recomenda que ele contrate um advogado para dar andamento para uma retificação judicial. É mais rápido e não trava o profissional.

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  3. Interesante a duvida do Marcelo, que certamente é de muita gente
    Também gostaria de saber como proceder junto ao Reg de Imóveis, quando isto acontecer comigo.
    Carlos ALberto de Lima
    Eng Civil
    IBAPE-SP 543

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  4. Bom dia Dr. Estou com uma dúvida: Tenho uma sentença fruto de uma ação de reconhecimento de união cumulada com arrolamento de bens que reconheceu o direito de meação de um imóvel à minha cliente. Acontece que ao levar para registro a carta de sentença, o registrador devolveu nota, solicitando retificação da matrícula. Na matrícula há outra proprietária que não quer fazer nada. Posso entrar com a ação de retificação judicial mesmo minha cliente não sendo proprietária na matrícula, mas possuindo a carta de sentença? Obrigada e agradeço esse canal. Rafaela Cadeu de Souza- São Carlos-SP

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  5. Parabéns Doutor, pelo artigo, que mesmo resumido deixa claro o dever de ofício do registrador, função que, pelo conteúdo do artigo, V. Sia, exerce muito bem.
    Sou advogada, e recentemente me deparei com um caso que se adequa exatamente ao seu artigo: Protocolei no Cartório um processo de apuração e retificação de áreas remanescentes de três imóveis objetos de transcrições. Ocorre que referidas transcrições são compostas por partes de imóveis, visto que estas, deram origem a outra transcrição que é composta de partes desses imóveis, ou seja, conforme a lei tal procedimento é totalmente legal visto que nos títulos existem áreas disponíveis, apuradas por profissional habilitado através de memorial e levantamento topográfico. Para minha surpresa o Cartório elencou a seguinte nota devolutiva: Os imóveis foram transferido total ou parcialmente para outra transcrição. Não há como proceder a retificação pretendida por via administrativa.
    Pedi reconsideração e esta foi negada através de nova nota de devolução: pendencia anterior não solucionada.
    Diante do caso estou sendo obrigada a ajuizar a retificação judicial, porque o cartório, que deveria esclarecer a situação jurídica do imóvel, mesmo diante dos documentos apresentados comprovando as áreas disponíveis, com anuência de todos os confinantes, se nega a proceder com a retificação por não saber se o imóvel foi transferido total ou parcialmente. Resta claro que a transferência foi parcial tanto pelos títulos do próprio cartório como pelo levantamento topográfico. Diante dessa situação, pergunto: como devo proceder? Não quero suscitar dúvida, pois aqui é um processo muito lento, a retificação judicial também demanda bastante tempo. O que o Sr. me aconselha?

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  6. Bom Dia Dr. Eduardo!

    Meu pai comprou um imóvel Rural há muitos anos. Na certidão de Inteiro Teor do Imóvel, consta uma área de 1.200 ha. Porém, desde sempre temos conhecimento que essa área descrita na matrícula não corresponde à área real do imóvel, que possui cerca de 900 hectares além do descrito na matrícula.
    Em leitura da Escritura de compra e venda em que meu pai adquiriu o imóvel, observei a seguinte descrição: "Fazenda XXXX com duzentos e cinquenta (250) cruzeiros de terras e um mil e duzentos hectares (1.200 ha).
    Esse trecho referente aos 250 cruzeiros foi suprimido da matrícula.
    Em consulta ao cartório me foi informado que à época era comum a descrição do imóvel em cruzeiros e não em hectares.
    Diante disso cheguei a conclusão que a área de cerca de 900 ha, excedente aos 1.200 hectares, corresponde na verdade aos 250 cruzeiros que foi suprimido da matrícula.
    Diante dessa situação a minha pergunta é: O correto a fazer nesse caso é a Retificação de área seguindo todo o procedimento dos artigos 212 e 213 da lei 6015?

    Pergunto isso porque no RI se recusaram a retificar, justificando que seria o caso de Retificação judicial ou até mesmo de usucapião. O que discordo totalmente.

    Gostaria muito de ter sua opinião neste caso.

    Desde já agradeço a atenção!

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