Para atuar na área do direito registral imobiliário, o profissional deverá conhecer os elementos que integram o registro de imóveis, pois cada um possui características próprias e se subordina a regras e princípios específicos.
A eficácia do registro é um fenômeno que está restrito às situações jurídicas previstas na legislação de direito material. No entanto, seu grau de percepção pela sociedade depende do aprimoramento do dado registrado, pois os direitos regularmente constituídos exigem uma eficiente publicidade registral, a qual somente alcança seu resultado se os elementos do registro estiverem bem descritos e caracterizados.
Portanto, cada elemento do registro deve ser tratado com o máximo de atenção, pois o conteúdo de qualquer assento registral deve ser o mais correto, o mais claro, o mais inteligível e o mais específico possível. Somente assim, os efeitos do registro serão benéficos à comunidade.
Elemento é tudo aquilo que entra na composição de algo, é a parte de um todo e, por integrar um corpo coeso, os elementos se interrelacionam. Assim, qualquer modificação em um produz efeitos imediatos nos demais. No registro imobiliário, o corpo é representado pela matrícula, entendido esta como o conjunto completo formado pela descrição do imóvel, pelos registros e pelas averbações. E, na matrícula, são encontrados os seguintes elementos:
- elemento jurígeno: a relação jurídica (o direito ou a informação inscritível);
- elemento subjetivo: o titular do direito (dotado de posição jurídica); e
- elemento objetivo: o imóvel matriculado (com incidência de situação jurídica “stricto sensu”).
O elemento jurígeno é a relação jurídica que ingressa na matrícula com o registro do título. Assim, uma escritura pública de compra e venda do imóvel é um título que, ao ser registrado, estampará na matrícula a relação jurídica denominada “compra e venda”. Essa relação jurídica afetará os demais elementos, como explicado a seguir.
O elemento subjetivo é formado pelas pessoas que ingressam no fólio real com uma determinada posição jurídica (proprietário, credor, usufrutuário). A posição jurídica é determinada pela relação jurídica e, muitas vezes, é múltipla (no registro de compra e venda, o registro espelha duas posições jurídicas no tocante ao adquirente, a de comprador, enquanto vigorou a obrigação pactuada, e a de proprietário, com o registro do título).
O elemento objetivo é o bem imóvel sobre o qual incidem as situações jurídicas inscritas. Além do imóvel, há também suas eventuais parcelas,[1] como servidões, reserva legal e construções, as quais devem ser descritas e caracterizadas pela técnica própria da agrimensura (especialidade objetiva). O imóvel, por si só, possui sua valoração jurídica (situação jurídica “stricto sensu”), como figura meramente técnica (rural ou urbano; público ou privado) ou como resultado de alguma relação jurídica específica (gravado com hipoteca; indisponível por determinação judicial; penhorado em ação trabalhista; arrecadado em processo falimentar).
Elementos do registro imobiliário.
Com base no título (compra e venda, por exemplo), é feito o registro da relação jurídica (elemento jurígeno) e, consequentemente, ocorre a transmissão da propriedade ao adquirente, que passa a ostentar a posição jurídica de proprietário (elemento subjetivo) do imóvel descrito e caracterizado na matrícula (elemento objetivo). As várias relações jurídicas, as posições jurídicas resultantes e as situações jurídicas específicas do imóvel estão todas concentradas na matrícula, motivo pelo qual se diz que esta é o repertório das situações jurídicas “lato sensu” incidentes sobre o imóvel.
O registro de imóveis constitui a maior parte dos direitos reais, atua como legitimador das posições jurídicas (ainda que com eficácia “iuris tantum”) e confere efeitos “erga omnes” a uma pluralidade de direitos obrigacionais inscritíveis, tornando públicas as relações jurídicas, as posições jurídicas e as situações jurídicas dos imóveis de todo o país.
A essa altura surge a seguinte questão: o registro imobiliário brasileiro é um registro de documentos ou um registro de direitos?
Em um sistema de Registro de Documentos, a validade do título levado ao registro é o que determinará as indenizações a serem pagas em eventuais conflitos, isto é, quem possui um título válido manterá sua aquisição, esteja ou não este título registrado. Já nos sistemas de Registro de Direitos, como é o caso da Espanha, não se garante o título, mas o titular do direito real registrado. E aqui há de se fazer uma ressalva importante. Vejamos. Mais precisamente no caso espanhol, dada a adoção integral do Princípio da Fé Pública Registral, os conflitos de titularidade sempre se resolverão em favor do titular registral.[2]
Um registro de documentos caracteriza-se pela mera conservação dos títulos, pois são estes que determinam as situações jurídicas. Pode até haver uma preferência aos títulos que ingressaram antes no registro, mas esse ingresso não se submete a um rígido controle qualificatório, típico de um sistema de registro de direitos.
Por outro lado, o registro de direitos é caracterizado pela rígida qualificação registral dos títulos, pois o que ingressa no fólio real não é o título, mas sim a situação jurídica (o direito) que ele representa. Por esse motivo, a depuração dos direitos registráveis é minuciosa, aplicando-se na qualificação todos os princípios registrais.[3]
Diante disso, não há dúvidas de que o sistema registral imobiliário do Brasil é, efetivamente, um registro de direitos, bastando apenas que o legislador institua a fé pública registral, como forma de garantir terceiros de boa-fé e de diminuir os custos decorrentes da falta de um sólido marco jurídico.
[1] A parcela deve ser entendida “como subentidade do imóvel, para separar áreas com diferentes regimes jurídicos. Ela nunca engloba mais do que um imóvel.” (Jürgen Philips, Conceito de imóvel e parcela no cadastro georreferenciado, p. 105).
[3] Marcelo Augusto Santana de MELLO, Curso de verão da Fiiap e colégio de registradores da Espanha; primeiras impressões, p. 170.
Boa noite Eduardo, neste momento surge-me uma dúvida: Suponhamos que Luiz possui uma matrícula de imóvel, na década de 40, na qual esta foi fracionada em dois imóveis e que receberam suas matrículas nos anos 80. Da matrícula primitiva foi vendida a área remanescente através de escritura de compra e venda nos anos 80. A dúvida: É possível registrar este imóvel, através da escritura de compra e venda, e traslada-la para uma matrícula, mesmo que os transmitentes já tivessem falecidos?
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