sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Sobrecadastramento de Terras; quem tem "culpa no cartório" não é o cartório!


Nesta semana, foram publicadas pela Imprensa na internet algumas reportagens sobre o grande problema do cadastro fundiário do país, em que o total de imóveis rurais cadastrados supera a extensão territorial do país.
Trata-se de uma questão antiga, de conhecimento geral, sendo, inclusive, um dos principais motivos da criação da legislação do georreferenciamento, cuja aplicabilidade está colaborando para a solução desse problema.
No entanto, o texto dessas reportagens comete uma grande injustiça com a atividade registral imobiliária. Ao confundir os conceitos de "cadastro" e "registro", deduz, equivocadamente, que a responsabilidade por essa lamentável situação é do Registro de Imóveis, devido a fraudes e erros cometidos dentro dos cartórios. Partindo de premissas falaciosas, o autoritário dedo da acusação acabou sendo apontado para o lado errado.
Diante dessa injusta acusação, o IRIB sentiu-se na obrigação de contatar o jornalista autor das reportagens para esclarecer os fatos, indicando cada um dos equívocos de suas publicações. Por determinação do Presidente do IRIB, Dr. Ricardo Coelho, coube a mim essa delicada missão.
Segue abaixo o inteiro teor do comunicado que o IRIB enviou ao jornalista de "O Estado de S.Paulo".
EA





Conchas, 8 de fevereiro de 2010.

Prezado Sr. Roldão Arruda
DD. Jornalista de O Estado de S. Paulo

Na qualidade de diretor de assuntos agrários do IRIB - Instituto de Registro Imobiliário do Brasil, tenho a grata satisfação de contatar V. Sa. para apresentar alguns esclarecimentos sobre a atividade registral imobiliária, a qual, em notícias recentes de sua autoria, tem sido confundida com a atividade cadastral, de competência do Poder Executivo.
Ciente de seu compromisso com a verdade, lema de todo bom jornalista que tem o dever de manter bem informada a população, peço vênia para inserir, nas linhas seguintes, alguns trechos das últimas publicações sobre o tema “sobrecadastramento de terras” e, logo após cada passagem, apresentar nossas considerações, as quais poderão servir de elementos de convicção para que as próximas notícias sobre cadastro e registro estejam melhor embasadas.
Por atuar na defesa jurídica do direito da propriedade privada, o Registro de Imóveis tem uma responsabilidade muito grande na garantia do Estado Democrático de Direito, motivo pelo qual o IRIB sentiu necessidade de contatá-lo na esperança de poder esclarecer o presente equívoco.
O IRIB agradece pela sua gentil atenção e coloca-se à sua inteira disposição para esclarecer o que for necessário.

Atenciosamente,

Eduardo Augusto
Diretor de Assuntos Agrários do IRIB 
Registrador Imobiliário em Conchas, SP 

REPORTAGEM 1/4
No papel, Brasil é dois Estados de SP maior do que o oficial
Sindicato de peritos agrários detectou que cadastro rural do país tem 600 mil km² a mais que a dimensão territorial de 8,5 milhões km²
02 de fevereiro de 2013 | 21h44
Roldão Arruda, de O Estado de S. Paulo

Os peritos concluíram que o Brasil, uma das maiores potências agrícolas do mundo, está longe de ter um cadastro de terras confiável. O problema mais aparente é o que eles chamam de sobrecadastro - quando a soma das áreas declaradas pelos proprietários nos cartórios supera a superfície real do município…
Em todos os fóruns que tratam desse assunto, tenho ouvido um discurso-padrão. Os interlocutores costumam afirmar o seguinte: 
1) o Brasil não conhece suas terras; 
2) inexiste um cadastro imobiliário que represente a realidade do País; e 
3) os cadastros imobiliários que existem são falhos, lacunosos e conflitantes. 
Isso é a mais pura verdade. É indiscutível.
No entanto, alguns estudiosos vão além e dizem que o cadastro do registro de imóveis também é falho, lacunoso e conflitante. 
Puro engano...
O cadastro no registro imobiliário não é ruim nem bom; isso porque simplesmente esse “cadastro” não existe!
Cadastro é um inventário, um rol de informações sobre determinado interesse, tendo por base pessoas ou coisas. Seu objetivo é político-administrativo, podendo ser utilizado em qualquer seara (econômica, social, fiscal, segurança nacional, ambiental). A atividade cadastral é competência do Poder Executivo, que tem a missão de colher informações que lhe propiciem gerenciar, com eficiência, o povo em seu território. Isso porque o mundo gira hoje em torno da informação (a Era da Informação), pois sem ela o fracasso é certo.
Registro, por sua vez, não trata de nada disso. O registro imobiliário não tem a missão de inventariar imóveis, nem ao menos controlar sua quantidade, valor ou produtividade. Ao registro cabe tão-somente cuidar do direito constitucional da propriedade privada e os demais direitos ligados ao bem imóvel, constituindo e tornando públicos esses direitos. Ou seja, somente os imóveis qualificados pela existência de um proprietário estão matriculados no registro imobiliário. Os imóveis “sem dono”, ou seja, sem algum título reconhecido pela lei, não podem constar do acervo registral.
Portanto, cadastro é conjunto de informações sobre o território feito pelo Executivo para viabilizar sua atuação político-administrativa na condução do Estado, orientando as políticas públicas com vistas ao desenvolvimento nacional. E o registro atua na constituição do direito da propriedade privada, com o objetivo não apenas de garantir o direito do titular em face de outros particulares, mas, principalmente, para garantir o direito do povo em face do próprio Estado, que deverá respeitar o direito fundamental da propriedade privada. Por esse motivo o registrador é um guardião da liberdade civil em face do próprio poder público.
Por fim, o cadastro dos imóveis rurais do Brasil é de competência do Incra e não do Registro de Imóveis.
Mais sobre esse tema (cadastro e registro):

Pelas informações obtidas no Incra, dos 5.565 municípios brasileiros, 1.354 tem sobrecadastramento, o que representa cerca de um em cada quatro. 
Esse critério de comparar a área cadastrada com a extensão territorial para identificar o sobrecadastramento é falho. 
O sobrecadastramento (mais de um cadastro abrangendo uma mesma área) ocorre no Brasil como um todo e não apenas nesses 1.354 municípios. Essa indicação refere-se apenas ao cadastramento cuja soma ultrapassa o território municipal (sobrecadastramento indiscutível), mas isso não significa que os demais municípios estão livres dessa falha, pois o problema costuma possuir duas faces inseparáveis: áreas com cadastros sobrepostos e áreas sem nenhum cadastro. Ou seja, enquanto não houver o completo georreferenciamento das unidades imobiliárias, não há como apurar o total de área cadastrada no Brasil, mas apenas o total de área indicada no cadastro, informação que, no momento, não representa uma quantificação do espaço territorial.

A razão mais comum para o descompasso são fraudes nos registros e até erros na transcrição dos números. Mas não é só. Os peritos apontam desatualização dos registros e, sobretudo, as condições precárias em que são feitos.
Afirmação totalmente equivocada.
O descompasso entre o cadastro e a realidade fundiária não tem origem no registro imobiliário, pois o cadastro rural no Brasil foi criado mediante declarações unilaterais de quem se dizia proprietário ou possuidor, sem que houvesse qualquer controle de sua veracidade ou consistência. Sua origem está no “registro do vigário”, um verdadeiro cadastro público que de registro nada tinha. 
Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850.

Art. 13. O mesmo Governo fará organizar por freguezias o registro das terras possuidas, sobre as declarações feitas pelos respectivos possuidores, impondo multas e penas áquelles que deixarem de fazer nos prazos marcados as ditas declarações, ou as fizerem inexactas.

Decreto nº 1.318, de 30 de Janeiro de 1854.

Art. 91. Todos os possuidores de terras, qualquer que seja o título de sua propriedade, ou possessão, são obrigados a fazer registrar as terras, que possuírem, dentro dos prazos rareados pelo presente Regulamento, os quais se começarão a contar, na Corte, e Província do Rio de Janeiro, da data fixada pelo Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Império e nas Províncias, da fixada pelo respectivo Presidente.

Art. 97. Os vigários de cada uma das Freguesias do Império são os encarregados de receber as declarações para o registro das terras, e os incumbidos de proceder a esse registro dentro de suas Freguesias, fazendo-o por si, ou por escreventes, que poderão nomear, o Ter sob sua responsabilidade.
Isso gerou um cadastramento de imóveis sem controle de sua titularidade, dimensão e localização. Além disso, não havia como acompanhar as constantes mutações tanto na titularidade como na formatação do imóvel (parcelamentos e unificações). Esse problema persiste até os dias atuais.
Essa falha, no entanto, não deve ser creditada na conta do Incra, dos cartórios nem de ninguém. Trata-se de uma herança advinda da forma como o Brasil foi colonizado e da confusão legislativa gerada pelas transições dos sistemas colonial, imperial e republicano. Um bom exemplo dessa “herança” é a questão das terras devolutas, originadas no descumprimento de uma cláusula resolutiva de “cultivar a terra”, imposta pelo sistema sesmarial das capitanias hereditárias.
O registro de imóveis surgiu apenas em meados do Século XIX, inicialmente apenas para o registro de hipotecas (Decreto nº 482/1946) e, depois, pela Lei nº 1.237/1864, para o registro facultativo das transações imobiliárias. Mas, somente no Século XX, com o advento do Código Civil de 1916, o registro passou a ser obrigatório para a constituição dos direitos reais sobre imóveis.
A partir de então, os títulos de transmissão de propriedade imobiliária passaram a ser transcritos no Registro de Imóveis, títulos estes que, por óbvio, não passavam pelo controle de veracidade quanto à formatação, localização e dimensão do imóvel, competindo ao registrador imobiliário tão-somente verificar se o instrumento cumpria a formalidade imposta pela lei (escritura pública, título judicial, continuidade registral, etc.).
Após a edição da Lei nº 6.015/1973 (Lei dos Registros Públicos, que entrou em vigor em 1/1/1976), o sistema de transcrição de títulos foi substituída pela matrícula dos imóveis (cada unidade imobiliária descrita em uma matrícula). Somente a partir desse momento, o item “descrição do imóvel” passou a ser um elemento essencial para o registro imobiliário.
No entanto, a lei não determinou a matriculação de todos os imóveis. As transcrições continuam produzindo efeitos legais e somente deverão ser encerradas para gerar uma nova matrícula quando do primeiro registro. Ou seja, como existem ainda muitos imóveis que não foram objeto de nenhuma transação desde 1977, estes ainda não foram matriculados e ainda continuam representados por uma ou mais transcrições.
Além disso, a Lei nº 6.015/73 pecou em não definir, de forma clara, a abrangência do termo “suas características” (artigo 176, que dispõe dos itens essenciais da matrícula), tendo resultado em posições doutrinárias e jurisprudenciais defendendo que a lei não exigia nenhuma formalidade para se descrever o imóvel. Hoje, felizmente, a interpretação evoluiu. O imóvel deve ser descrito de acordo com as regras gerais da Agrimensura.
Mais sobre esse tema (descrição do imóvel na matrícula):

“Quase tudo gira em torno da declaração que o proprietário faz no cartório sobre o tamanho de sua terra”, diz Fernando Faccio, perito federal do Incra em Florianópolis (SC) e porta-voz do sindicato. 
Informação totalmente equivocada, pois não se faz nenhum tipo de declaração no registro imobiliário; lá apenas se registra um título que cumpre as formalidades da lei.
O local em que o “proprietário faz a declaração sobre o tamanho de sua terra” é no Incra (instituição responsável pelo cadastro rural). Essa declaração, no passado, era feita sem nenhum controle de veracidade, mas hoje a situação é bem diferente, pois, para cadastrar um imóvel rural, o declarante deve comprovar a natureza jurídica de sua posse.

“Os órgãos estaduais de terras não possuem um bom mapeamento das áreas; os cartórios não têm obrigação de garantir que a terra registrada não está em cima de outra; e o Poder Público também não vai lá verificar.”
Isso mudou. Com a desjudicialização do procedimento de retificação de registro, o registrador imobiliário passou a ter competência para corrigir as descrições dos imóveis, devendo controlar não apenas a dimensão dos bens imóveis (aspecto quantitativo), mas também a sua exata delimitação espacial (aspecto qualitativo).
Com a legislação do georreferenciamento, o registrador imobiliário passou a trabalhar em parceria com o Poder Público (Incra), pois cadastro e registro, apesar de possuírem natureza jurídica e objetivos diversos, devem atuar em perfeita sintonia, pois um dos elementos mais importantes do cadastro é exatamente a situação jurídica do imóvel, que é definida pelo registro imobiliário.

Terra a menos. Sobra de terra no cadastro não é o único drama. Na região Norte do País verifica-se o subcadastramento, que ocorre quando a superfície registrada é menor do que a real. A causa principal é a existência de grandes áreas de terras devolutas, controladas pelo Estado e frequentemente ocupadas de maneira irregular.
Esse “subcadastramento” não garante a inexistência de cadastros múltiplos de uma mesma área. Enquanto não houver o cadastramento georreferenciado de toda a extensão territorial, continuará havendo sobrecadastramento, por uma série de fatores.

O sindicato estima que na região amazônica só 4% do território está cadastrado. “Os órgãos de governo não tem controle de suas terras, o que acaba favorecendo os conflitos agrários na região”, afirma Faccio.
A falta de controle tem origem no próprio Governo, que não tem controle de suas terras. 
Essa falta de controle não significa necessariamente incompetência administrativa de seus governantes, pois esse problema tem origem histórica, na forma como o território brasileiro foi ocupado e na confusão legislativa do tempo imperial.

O assunto atrai a atenção da presidente Dilma Rousseff desde quando era chefe da Casa Civil. Confrontada com questões relacionadas a desmatamento, conflitos agrários, políticas sociais na zona rural, a então ministra constatou que existem cadastros paralelos no Incra, na Receita Federal e nos ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura - e que nenhum deles é confiável.
Na Presidência, ela tem cobrado a consolidação de um cadastro único e confiável. A ministra Gleise Hoffmann, que substituiu Dilma na Casa Civil, é uma das pessoas encarregadas de analisar a questão. 
Que nenhum desses cadastros é confiável, é a mais pura verdade. 
A preocupação sobre esse tema e a revolução legislativa que está levando o Brasil para a solução do caso é a Legislação do Georreferenciamento (Lei nº 10.267/2001 e Decreto nº 4.449/2002), que, apesar das críticas, tem colaborado muito para o aperfeiçoamento do cadastro imobiliário.

REPORTAGEM 2/4

Em Teodoro Sampaio (SP), procura-se terra até 'dentro do rio'
Registro de propriedades na cidade, localizada em área de conflito agrário, supera em 42% a área real
02 de fevereiro de 2013 | 21h 54
José Maria Tomazela, de O Estado de S. Paulo

TEODORO SAMPAIO - O agricultor Reinaldo Nunes, de 35 anos, ainda tenta entender o que aconteceu com mais da metade do lote que recebeu da reforma agrária no Assentamento Dona Carmen, em Teodoro Sampaio, a 660 km de São Paulo. O Sítio Quatro Irmãs ocupa uma faixa entre a Rodovia SP-613 e o Rio Paranapanema e, no papel, tem 7,30 hectares. Ao medir a área, Nunes encontrou apenas 2,60 hectares. “Só se o resto estiver dentro do rio”, ironiza.
Eis aqui a prova de que a falha não está no registro imobiliário. A falha, nesse caso, foi do órgão que elaborou o projeto do referido assentamento. 
Não são poucos os casos em que o Governo (tanto o federal como o dos estados) tem distribuído terras para colonização sem um efetivo controle. Muitas plantas não seguiam as regras da boa Agrimensura, pois não indicavam as medidas perimetrais e se apoiavam em precários marcos que desapareceram com o tempo. Resultado disso: não há como utilizar essas plantas para reconstituir a verdadeira situação jurídica de muitos desses assentamentos, pois a grande parte dos imóveis sofreu mutações no decorrer do tempo (fusões e desmembramentos informais, invasões, etc). 
Portanto, uma área de colonização que deveria estar perfeitamente cadastrada pelo Poder Público, pois foi por ele criada, não mais confere com os dados arquivados. 

Grandes propriedades rurais são alvos de ações movidas pelo Estado por terem sido consideradas terras griladas, obtidas com base em documentos adulterados. Por terem a titularidade contestada, também viraram alvos dos sem-terra.
Apesar de a grilagem de terras ser uma realidade brasileira, não se deve generalizar e rotular de “grileiros” todos os atuais proprietários dos imóveis localizados, por exemplo, no Pontal do Paranapanema. É verdade que existe algum vício na origem (por isso tais terras foram declaradas devolutas pelo Poder Judiciário), mas muitos dos atuais “proprietários” compraram as terras sem saber que havia esse vício, ocorrido muito tempo antes da criação do registro imobiliário. Em outras palavras, muitos deles também são vítimas desse descontrole fundiário que ocorreu na história de nosso Brasil.

REPORTAGEM 3/4

Incra decide varrer cadastro rural em busca de erros
Medida foi anunciada após 'Estado' revelar que o Brasil dos cartórios é 600 mil km² maior do que a dimensão real do território
04 de fevereiro de 2013 | 2h06
Roldão Arruda, de O Estado de S.Paulo

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) deve realizar, ainda no primeiro trimestre, uma varredura de todas as informações disponíveis de registros de terras no País para corrigir eventuais erros e coibir fraudes. A medida foi anunciada após reportagem do Estado de domingo revelar que a área de terras registradas em cartórios brasileiros é 600 mil km² maior do que a superfície real do País. A diferença equivale a duas vezes o território do Estado de São Paulo.
Afirmação equivocada. 
O que foi revelado é a existência de um cadastro no Incra que é 600 mil Km² maior que a superfície do território brasileiro e não a “área de terras registradas”, mesmo porque não há como obter esse dado. 

A autarquia informou ainda, por meio de nota, que está investindo na melhoria do cadastro de imóveis rurais no País e que seus técnicos estão trabalhando em várias frentes, com o apoio do Exército e também do Ministério do Meio Ambiente.
Afirmação correta!

Reportagem do Estado mostrou que as terras registradas em cartórios equivalem a 9,1 milhão de km², enquanto a superfície real do País, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é de 8,5 milhões de km². Os dados foram levantados pelo Sindicato Nacional de Peritos Federais Agrários.
Afirmação errada!! Quem obteve esse dado nos cartórios? Isso é impossível!!! Não compete ao registro cadastrar imóveis, mas sim ao governo. No caso dos imóveis rurais, a competência é do Incra; e tal cadastro foi criado com base exclusiva na declaração unilateral de quem se dizia dono. Felizmente hoje a legislação mudou e exige a apresentação do título de propriedade para os novos cadastramentos.

Uma das providências anunciadas pelo Incra, já em andamento, é a associação de informações do cadastro com a base de mapas do IBGE, para evitar o problema da sobreposição de áreas nos registros em cartório. O cadastro também está sendo cotejado com dados de georreferenciamento.
Trata-se da legislação do georreferenciamento (Lei nº 10.267/2001 e Decreto nº 4.449/2002).

Certificados. A autarquia também informou que foram tomadas providências para diminuir a lentidão na análise dos certificados de propriedade rural - uma das principais causas da existência de grande número de áreas com sobrecadastro.
"Em todos esses casos existe a segurança de que os limites não se sobrepõem a outros imóveis e que o georreferenciamento foi realizado conforme as especificações técnicas legais", informou a instituição.
Afirmação parcialmente correta, pois o Incra não tem condições técnicas nem competência legal para dizer que o imóvel georreferenciado não está se sobrepondo a um outro imóvel. A competência do Incra resume-se a certificar de que a referida planta não se sobrepõe a nenhuma outra planta certificada pelo Incra, ou seja, se alguém apresentar uma planta englobando uma parcela de área que não lhe pertence, não tem como o Incra definir que a planta não confere com o seu título de domínio (devido à precariedade da descrição do imóvel, por exemplo) e acabará certificando esse trabalho técnico. É por esse motivo que a certificação não implica o reconhecimento da titularidade da área, pois ela representa apenas uma análise técnica do levantamento efetuado pelo agrimensor.
Decreto nº 4.449, de 30 de outubro de 2002.

Art. 8º - § 2º.  A certificação do memorial descritivo pelo INCRA não implicará reconhecimento do domínio ou a exatidão dos limites e confrontações indicados pelo proprietário.
Após isso, o interessado levará os trabalhos técnicos certificados para registro. Compete ao registrador imobiliário verificar se a planta certificada abrange apenas o imóvel juridicamente constituído em nome do proprietário, devendo indeferir o pedido se constatar inclusão de área não titulada ou alguma tentativa de legitimação posse. Aqui o registrador imobiliário atua numa atividade jurídica de controle da legalidade para coibir falhas e fraudes.
Por esse motivo, o IRIB sugeriu ao Incra uma alteração legislativa para garantir uma maior agilidade na certificação dos imóveis rurais. Basta alterar a redação do artigo 9º do Decreto nº 4.449/2002, para inverter a sequência dos procedimentos.
O “georreferenciamento” deve ser iniciado no Registro de Imóveis, mediante o procedimento extrajudicial de retificação de registro, que já é bastante utilizado para retificar imóveis urbanos e imóveis rurais ainda beneficiados pelo prazo carencial. Nesta fase inicial, o registrador imobiliário irá analisar a titularidade da área, identificar as confrontações e determinará o saneamento de todas as falhas porventura existentes no imóvel (falta de CCIR, atualização do cadastro na RFB para fins de ITR, especialização da reserva legal, etc.). 
O Incra não tem condições nem competência para analisar juridicamente a regularidade do domínio do imóvel que lhe é apresentado por meio de memorial descritivo. Sua função, para o caso de certificação, repita-se, é exclusivamente analisar a poligonal objeto do memorial descritivo a fim de verificar se ela não se sobrepõe a nenhuma outra constante de seu cadastro georreferenciado e se o memorial atende às exigências técnicas, conforme ato normativo elaborado pela autarquia. Se a área constante do memorial não corresponder a da matrícula ou se a descrição do imóvel for inserida na matrícula em detrimento do direito de propriedade de terceiros ou ensejando aquisição indevida de área excedente ou de posse, o erro e a responsabilidade serão imputados exclusivamente ao oficial de registro de imóveis. (Ridalvo Machado de Arruda, Procurador Federal do Incra) 
A única diferença do procedimento tradicional está no fato de que, após a qualificação positiva dos trabalhos técnicos, o registrador não praticará o assento registral retificatório, pois irá aguardar a certificação do INCRA no tocante apenas às exigências técnicas e à não-sobreposição da poligonal a outra poligonal constante de seu cadastro georreferenciado. Assim o Incra não precisará se preocupar com a demorada e complicada análise dos títulos de propriedade, agilizando muito sua atuação. 
Somente depois da certificação do INCRA, o registrador procederá a retificação na matrícula do imóvel.
Prevendo o Decreto esse rito procedimental, serão raros os casos de uma certificação do INCRA não resultar no registro esperado. O procedimento de certificação será ágil, mesmo antes de sua completa informatização, será muito mais seguro, no tocante aos direitos envolvidos, e conseguirá atender a sociedade neste importante programa de identificação da malha fundiária do País.
A proposta foi feita, mas, até o momento, o Decreto nº 4.449/2002 ainda não foi modificado.
No entanto, seguindo a orientação do IRIB, o Incra acabou de mudar sua sistemática de recepção e análise dos trabalhos técnicos, criando o Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), ou seja, a análise não irá mais abranger a titularidade dos imóveis (competência do registrador imobiliário) mas apenas a exatidão do levantamento georreferenciado:
O Sigef é uma ferramenta eletrônica criada para enviar, recepcionar, validar, organizar e disponibilizar dados georreferenciados de imóveis rurais. Esse novo sistema é capaz de analisar sobreposição com o cadastro georreferenciado do Incra e gerar planta e memorial descritivo de forma automática, atendendo de forma eficiente e eficaz o que determina o § 5° do art. 176 da Lei 6.015/73, incluído pela Lei 11.952/09. 
Mais sobre esse tema (proposta do IRIB ao Incra):
Mais sobre esse tema (diferença dos conceitos de imóvel rural):


REPORTAGEM 4/4

'Cadastro do Incra é incoerente e irreal', afirma especialista
04 de fevereiro de 2013 | 2h07
O Estado de S.Paulo
O excesso de terras no cadastro do Incra não deve ser atribuído aos proprietários rurais, nem aos cartórios, mas sim às deficiências do próprio Incra, na avaliação do advogado e engenheiro agrônomo Paulo Daetwyler Junqueira. Ele diz que o cadastro central só deveria aceitar o registro de nova propriedade depois de verificar se já foi dada baixa no registro anterior da mesma. "Seria como um funcionamento contábil, na base do crédito e débito, só entraria uma área se outra fosse debitada", afirma. "Nem sempre houve preocupação do Incra de debitar a área para que novo registro fosse cadastrado. Criaram novos cadastros de áreas, que na verdade não eram novas, pois já existiam, como mostra a reportagem do Estado." Ele diz que a base cadastral do Incra é "incoerente e não pode ser tomada como real". /R.A.
Declaração perfeita.
Uma das grandes dificuldades do cadastro é controlar as mutações ocorridas nos imóveis, que as alienações (cujo descompasso gera apenas a desatualização do atual titular) como principalmente das mutações físicas do imóvel (parcelamento do imóvel, que gera o sobrecadastramento e a total perda do controle fundiário).
Exemplo: uma fazenda de 1.000 hectares está cadastrada no Incra há muitas décadas, com base numa transcrição do registro imobiliário.
No entanto, tal fazenda foi objeto de vários parcelamentos, resultando em dezenas de outros imóveis rurais, os quais, posteriormente, foram também parcelados em centenas de outros e assim por diante. Das centenas de imóveis resultantes, grande parte dos atuais proprietários cadastraram seus imóveis. 
Resultado: 1 cadastro de 1.000 ha (a origem, que não mais existe no físico); algumas dezenas de cadastros de 300 ou 500 ha (a maior parte desses imóveis já não mais existem) e centenas de pequenos imóveis rurais. Soma de todos esses cadastros: o dobro, o triplo ou até o quádruplo da área real.
Não se trata de fraude, não se trata de grilagem, não se trata de registro precário. A conservação de um cadastro requer muito mais do que boa vontade e tecnologia. Requer padrão de conceitos, coisa que não existe hoje.
Um dos grandes problemas é a diferença do conceito de imóvel rural para o registro (conceito jurídico do direito de propriedade) e do Incra (conceito agrário). Diante dessa divergência, fica muito difícil ao registrador colaborar com o Incra na fiscalização do cadastro (muitos cadastros somente são atualizados pelo proprietário em decorrência da fiscalização do registrador imobiliário, que está impedido de registrar transações imobiliárias sem a apresentação do CCIR). No entanto, muitos imóveis são formados por uma pluralidade de cadastros (cadastro de fração ideal) ou um único cadastro representa uma pluralidade de matrículas (sem segurança suficiente para definir quais matrículas).
A solução para essa questão é a criação de um cadastro territorial multifinalitário, que acate o conceito de parcela, que seria a “menor unidade territorial cujo levantamento seja jurídica e economicamente relevante”. Assim, esse cadastro poderia ser utilizado por todos os órgãos e instituições como uma base cadastral que supra suas demandas, sem necessidade de alterações ou de adaptações em sua estrutura.
Mais sobre esse tema (cadastro territorial multifinalitário):


CONCLUSÃO

Por fim, para melhorar o sistema de cadastramento dos imóveis rurais no país, basta torná-lo multifinalitário, ou seja, torná-lo uma base cadastral única, que seja confiável, segura e de utilidade para todos os órgãos e instituições que necessitam dessas informações.
O IRIB está atuando em parceria com o Incra para tentar reverter essa situação, herança de um passado complexo em termos fundiários. Mas, ao contrário do que muita gente pensa, a lei existente hoje é perfeitamente adequada para que seja obtido o progresso desejado; portanto, para a solução desse problema, basta cumpri-la.

Eduardo Augusto 
Diretor de Assuntos Agrários do IRIB 
Registrador Imobiliário em Conchas-SP 

2 comentários: