quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Largura da Estrada: Realidade Fática x Decreto Municipal


CONSULTA 

Prezado Dr. Eduardo: 

Estou com uma dúvida há tempos. Pesquisei na internet conversei com alguns advogados e ela ainda persiste. 
Estou iniciando um geo (para usucapião) de uma propriedade a qual é lindeira de uma estrada municipal. Em 2008, foi sancionado um Decreto pelo Prefeito que diz "Art. 1º - As estradas municipais obrigatoriamente terão 7m de largura para trânsito dos veículos." E, no artigo 2, diz:  "fica estipulada em 3m a direita e esquerda da faixa de trânsito, para servir de acostamento."
Minhas dúvidas são as seguintes: 
A rodovia possui somente 6 metros de faixa de trânsito. Como proceder em relação aos 7m e os 3m de cada lado? Algumas pessoas me disseram que deveria, a partir do eixo, projetar 6,5m para cada lado e, a partir daí, começar a descrição da propriedade. Alguns também me disseram que é uma faixa de domínio público, pois há o decreto. 
Estou lendo um livro de desapropriação e não consegui ainda entender se faixa de domínio tem que ser desapropriada ou se basta apenas a previsão no decreto. Afinal, devo ou não descontar a área prevista no decreto? 

Atenciosamente, 
Ricardo 


PARECER

Olá, Ricardo.
Para um imóvel privado transformar-se em um bem público há 3 hipóteses:
  1. desapropriação (amigável ou judicial);
  2. alienação (venda ou doação do particular ao poder público); ou
  3. efetiva destinação pública.
Portanto, o leito carroçável e as margens dessa estrada passaram ao domínio público automaticamente, pela simples destinação, independentemente de ter ou não ocorrido uma desapropriação regular. Nessa hipótese de ausência de desapropriação, o proprietário do imóvel que perdeu área para a estrada tem o direito de exigir judicialmente a justa indenização (isso denomina-se "desapropriação indireta"). Mas tal direito somente persistirá se não tiver ocorrido a prescrição (15 anos).
Até aqui, tudo está fácil.
No entanto, a sua questão traz um complicador: a previsão constante do decreto (leito carroçável de 7 metros + acostamentos de 3 metros = 13 metros) que não coincide com a realidade fática (6 metros).


Um decreto não tem o condão de, sozinho, transformar um bem privado em imóvel público. 
Ou seja, a área cercada do imóvel, que nunca foi ocupada pela estrada, não se transformou em bem público. Para que isso ocorra, deve ser procedida a regular desapropriação.
Esse decreto não tem o poder de confiscar a propriedade privada (apropriação sem indenização); trata-se apenas de um mandamento jurídico destinado ao Poder Executivo Municipal para que este regularize as estradas municipais, acertando seu leito carroçável de 7 metros e construindo os acostamentos de 3 metros em cada margem, devendo, para isso, desapropriar, na forma da lei, as áreas necessárias ao empreendimento.
Por outro lado, se houve desapropriação (amigável ou judicial), não importa se a estrada foi ou não construída, tenha ou não a largura exata; a totalidade da área desapropriada, mesmo que uma parte continue cercada e utilizada pelo particular, é imóvel de domínio público, não sendo passível nem mesmo de usucapião.
Um grande abraço.
EA