sexta-feira, 14 de maio de 2010

Anuência de Confrontante V

Valor da anuência do confrontante

O confrontante anuente atua como mera testemunha do procedimento retificatório, como um colaborador do oficial de registro, pois, diante de qualquer indício de problemas envolvendo os imóveis, ele será o primeiro a comparecer ao cartório para relatar suas suspeitas.
Caso ocorram falhas (por erro, fraude ou simulação), a descrição viciada não tem o condão de transferir direitos, sendo o ato nulo de pleno direito. A alteração de titularidade de parcela incluída irregularmente na descrição do imóvel somente será concretizada por usucapião resultante de efetiva posse daquele pedaço de terra e não pela simples descrição constante da matrícula. Isso porque a retificação de registro não faz coisa julgada, nem significa presunção contrária ao confrontante que, posteriormente, venha a perceber falhas na descrição a que ele anuiu. Defender tese contrária é um absurdo, pois significaria impor a todos os confrontantes a obrigação de contratar agrimensor para medir o seu imóvel, sob pena de perder parcela de seu bem em decorrência da retificação pretendida pelo seu vizinho.
A anuência de confrontante serve para prevenir litígios que tenham por objeto os limites das propriedades confinantes. Apenas e tão-somente isso. E essa anuência não necessita de maiores rigores, tanto que a lei aceita a simples anuência de um único condômino no caso de o imóvel vizinho ser de titularidade múltipla. E as normas de serviço da CGJ paulista (vista como rigorosa e tradicionalista) trazem outros exemplos mitigadores desse rigor (cônjuges, via pública, etc.).
Por fim, convém esclarecer que o artigo 213 não exige a anuência de confrontante para possibilitar a continuidade do procedimento e o deferimento da retificação. O que a lei exige é a ausência de impugnação. A coleta de anuências é uma providência de iniciativa do requerente da retificação que, se corretamente efetuada, dispensa a notificação do confrontante. Há necessidade de destacar esse importante detalhe para dirimir outra dúvida muito comum: o que fazer diante da expressa recusa de anuência feita, principalmente, pelo Poder Público?
Em algumas hipóteses de notificação do Poder Público, o departamento jurídico envia ao cartório um ofício recusando-se a anuir aos trabalhos técnicos de retificação de imóvel que confronta com imóvel público. Isso tem ocorrido em algumas regiões do país quando da confrontação com rodovias e ferrovias. Muitas vezes a argumentação assemelha-se a essa:
Não podemos anuir aos trabalhos técnicos apresentados pelo particular por não ter sido possível a este departamento a contratação de perito para efetuar o levantamento ‘in loco’ do imóvel público; portanto, diante do risco de invasão de bem público, impugnamos a presente retificação.
Como a lei não exige anuência, apenas a não-impugnação fundamentada, essa discordância do poder público não tem o condão de impedir a continuidade do procedimento. Essa impugnação, por ter sido motivada apenas pela falta de condições de vistoria do local, não pode ser considerada uma impugnação fundamentada. Aliás, seu objetivo é a mais pura injustiça, pois a falência operacional do Estado estaria barrando um direito líquido e certo do titular de ter seu imóvel corretamente descrito na matrícula. Ainda mais quando se trata de confrontação com rodovia ou estrada de ferro, em que praticamente inexiste potencialidade danosa para o poder público. Por fim, o verdadeiro perigo para o poder público não é uma descrição tendenciosa ou equivocada do imóvel privado, mas, sim, a real invasão do imóvel público por parte de pessoas carentes ou de movimentos político-sociais, situação que tem ocorrido em todo o país e que o Estado não tem conseguido controlar.
Como já foi afirmado, a anuência em procedimento retificatório não é “ato de alienação nem de oneração”, principalmente por parte do Estado, uma vez que os imóveis públicos não são usucapíveis. O confrontante, quer particular ou o poder público, não precisa ter medo de anuir aos trabalhos. Sua anuência não tem o condão de lhe retirar direito algum e, salvo se representar falsidade com o intuito de prejudicar terceiros, também não lhe causa responsabilização. O intuito da lei é apenas consultar o confrontante sobre a existência ou não de conflitos envolvendo suas divisas. Não havendo conflitos entre os vizinhos, nem indícios de malandragem por parte daquele que está retificando seu imóvel, o confrontante pode anuir sem receio, pois seria um absurdo afirmar que é da responsabilidade do anuente a prévia análise e interpretação de complicados trabalhos de agrimensura.

2 comentários:

  1. Muito bom Eduardo! Estou com um problema desses. O cartório de registro de imóveis está exigindo a anuência do poder publico (DER, procurador, etc.) para efetuar o registro da escritura de imóveis rurais. Poderia citar a lei que não exige tal anuência por parte do estado?
    nelsonsfujioka@gmail.com

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  2. Ótimo Eduardo,
    Estou com um caso que é o seguinte: após analisado o doct. de Retificação de área onde constatou-se uma área a menor, efetuei todos os procedimentos, notifiquei o DER visto que o imóvel faz frente para a PR-510, após o prazo de 15 dias (cujo órgão DER não tenho certeza se entraria como orgão público onde caberia o prazo de 30 dias), enfim, após o prazo dos 15, efetuamos o registro sem a manifestação do DER, mas acontece que após o registro recebemos uma manifestação do DER alegando haver invasões na PR-510 sentido Campo Largo à Bateas, e diversas alegações a respeito do procedimento do cartório, principalmente quanto a área à menor, se esta diferença de área não seria da desapropriação, o que acredito não ocorrer visto que na matrícula anterior o imóvel já constava com frente para esta rodovia. Poderia me ajudar nesta questão, o que fazer se o processo já foi registrado?
    luciane@cartoriocampolargo.com.br

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